quinta-feira, julho 24, 2008

Balada

Luzes coloridas, músicas, vozes, perfumes.
Luzes que ofuscam ao invés de iluminarem,
Música que ensurdece
Vozes que soam palavras falsas, efêmeras
Perfumes que se misturam a fumaça do cigarro
Sorrisos forçados, beijos vazios
olhares tendeciosos
olhares fúteis
comentários a cerca da aparência, do estilo, do jeito..
bebidas, bebidas, bebidas
a música continua a ensurdecer..
"Never stop the music"
o som aumenta
aumenta o vazio..
o sorriso esconde a falta do brilho
Alguém percebe que ele se foi?
a bebida busca preencer o vazio que não tem fim
a droga traz a ilusão
é quando ela se vai
o vazio não vai junto.
ele fica
atormenta
incomoda
questiona..
o vazio, que não tem fim.

terça-feira, julho 22, 2008



Ela gostava de sentir o sol no inverno. Gostava muito do sol, e no inverno mais ainda, pois podia senti-lo aquecendo o seu corpo. Era como se estivessem mais próximos, como se pudesse tocá-lo de verdade, numa troca íntima e essencial.
Naquele dia, ainda com os cabelos emaranhados e o olho meio aberto, saiu do ar gélido dos azulejos e sentiu o sol daquele iverno. Ficou parada, por alguns segundos, sentido o calor que tomava suas mãos. Olhou, sentiu e soltou um leve sorriso de gratidão inconsciente.
Se pudesse ficaria o dia todo ali, apenas ela e o sol. Sem mais ninguém.Desligaria o telefone, desligaria o computador, desligaria a mente. Principalmente, a mente. É possível desligar a mente? Ela achava que era. Cada vez que vinha aquele pensamento indesejado, ela buscava fugir. Ria, se enganava, buscava algo inútil pra fazer. Não queria pensamentos sérios. Eles exigem muito de nós. Estava cansada de se sentir cansada. Esse cansaço intesgotável. Não importa o que fizesse, sentia-se cansada. Cansada da paisagem, da rotina, da mesmisse. Agradecia ao Sol. Por não se entregar ao cansaço. Compartilhava com ele seus planos e ele os enchia de brilho, esperança e vigor. Agradecia ao Sol e torcia para que ele não fosse, nem levasse com ele tudo aquilo que lhe traz uma satifação inebriante.

O mundo não é cor de rosa.

Diante do horror do mundo, temos de ser felizes

ARNALDO JABOR

O Brasil está se defrontando com o absurdo de sua estrutura institucional. Esta explosão galáctica da crise entre polícia, política, Judiciário, empresariado, Estado e capital revela o tumor do absurdo nacional. Olho em volta e tenho de comentar o incompreensível, o indestrutível, o inexplicável, o inevitável, o incurável, o impossível.

É desanimador. Deprimo porque vivemos no Brasil uma dupla mensagem: tragédia nas notícias e gargalhadas nas revistas de celebridades. Dentro da paisagem tenebrosa, somos obrigados a ser felizes.

Hoje em dia é proibido sofrer. Temos de "funcionar", temos de rir, de gozar, de ser belos, magros, chiques, tesudos, em suma, temos de ter "qualidade total", como os produtos.
Para isso, há o Prozac, o Viagra, os "uppers", os "downers", senão nos encostam como mercadorias depreciadas.

No entanto, a depressão tem grande importância para a sabedoria; sem algum desencanto com a vida, sem um ceticismo crítico, ninguém chega a uma reflexão decente.

O bobo alegre não filosofa, pois, mesmo para louvar a alegria, é preciso incluir o gosto da tragédia. No pós-guerra, tivemos o existencialismo, o suicídio da literatura com gênios como Beckett e Camus ou o teatro do absurdo, o homem entre o sim e o não, entre a vida e o nada.

A infelicidade de hoje é dissimulada na alegria obrigatória.

"A depressão não é comercial", lamentou um costureiro gay à beira do suicídio, mas que tinha
de sorrir sempre, para não perder a freguesia.

O bode pós-moderno vem da insatisfação de estar aquém de uma felicidade prometida pela propaganda e pelo mercado.

É impossível ser feliz como nos anúncios de margarina, é impossível ser sexy como nos comerciais de cerveja. Ninguém quer ser "sujeito", com limites, angústias; homens e mulheres querem ser mercadorias sedutoras, como BMWs, Ninjas Kawasaki.

E aí, toma choque, toma pílula, toma tarja preta. Só nos resta essa felicidade vagabunda fetichizada em êxtases volúveis, famas de 15 minutos, "fast fucks", raves sem rumo.

O mercado nos satisfaz com rapidez sinistra: a voracidade, o tesão, o amor.

E pensamos: "E se não houvesse mais desejo? Eu posso escolher o filme ou música que quiser, mas, nessa aparente liberdade, "quem" me pergunta o que eu quero?

A interatividade é uma falsificação da liberdade, pois ignora meu direito de nada querer. Eu não quero nada. Não quero comprar nada, não quero saber nada, quero ficar deprimido em paz.
Estava neste ponto do artigo quando um Ananda Rubinstein, cientista política, me enviou um texto chamado "Elogio da melancolia", de Eric G. Wilson, da Universidade de Wake Forest.

Veio a calhar. Com destreza acadêmica, ele aprofunda meus conceitos. Ele escreve:

"Estamos aniquilando a melancolia. Inventaram a ciência da felicidade. Livros de auto-ajuda, pílulas da alegria, tudo cria um ‘admirável mundo novo’ sem bodes, felicidade sem penas. Isto é perigoso, pois anula uma parte essencial da vida: a tristeza."

Ele continua:

"Não sou contra a alegria em geral, claro... Nem romantizo a depressão clínica, que exige tratamento. Mas sinto que somos inebriados pela moda americana de felicidade.
Podemos crer que estamos levando ótimas vidas simpáticas e livres quando nos comportamos artificialmente como robôs, caindo no conto dos desgastados comportamentos ‘felizes’, nas convenções do contentamento.

Enganados, perdemos o espantoso mistério do cosmo, sua treva luminosa, sua terrível beleza. O sonho americano de felicidade pode ser um pesadelo.

O poeta John Keats morreu tuberculoso, em meio a brutais tragédias, mas nunca denunciou a vida. Transformou sua desgraça em uma fonte vital de beleza.

As coisas são belas porque morrem - ele clamava. A rosa de porcelana não é tão bela como aquela que desmaia e fenece.

A melancolia, a consciência do tempo finito é o lugar de onde se contempla a beleza. Há uma conexão entre tristeza, beleza e morte.

Só o melancólico cria a arte e pode celebrar a experiência do transitório resplendor da vida. A melancolia, longe de ser uma doença, é quase um convite milagroso para transcender o ‘status quo’ banal e imaginar inéditas possibilidades de existência.

Sem a melancolia, a terra congelaria num estado fixo, previsível como metal. Deste modo, o mundo se torna desinteressante e morre. Todo mundo ficaria contente com o que lhe é dado (que, alias, é o sonho do mercado - a satisfação completa do freguês).

Mas quando a gente permite que a melancolia floresça no coração, o universo, antes inanimado, ganha vida, subitamente. Regras finitas dissolvem-se diante de infinitas possibilidades.
A felicidade torna-se pouco - passamos a querer algo mais: a alegria (‘joy’). Mas, por que não aceitamos isso e continuamos a desejar o inferno da satisfação total, a felicidade plena?
A resposta é simples: por medo.

A maioria se esconde atrás de sorrisos tensos porque tem medo de encarar a complexidade do mundo, seu mistério impreciso, suas terríveis belezas.

Para fugir desta contemplação atemorizante, nos perdemos em distrações vãs e em um bom humor programado.

Somos de uma natureza incompleta, somos de vagas potencialidades, e isto faz da vida uma luta constante em face do desconhecido.

Usamos uma máscara falsa, sorridente, um disfarce para nos proteger do abismo.
Mas, este abismo é também nossa salvação.

Ser contra a felicidade é abraçar o êxtase.

A aceitação do incompleto é um chamado à vida. A fragmentação é liberdade.

É isso aí.

A felicidade tem um pouco de tristeza.
(Por Arnaldo Jabor, 22/07/2008 - O Es
tado De São Paulo)

sexta-feira, julho 18, 2008

E viveram felizes para sempre!



Lembro muito bem do primeiro dia em que vi a Aline. Ela estava sentada no corredor do Iel, conversando com a Marcela e contando que tinha perdido uma pasta. Nessa pasta tinha vários papéis importantes e entre eles, uma carta para o seu namorado. Eu não sabia nada sobre ela: não sabia quantos anos ela tinha, nem onde morava, mas eu pude ver, naquele momento, naqueles olhos intensos e puros, na doçura com que lembrou-se dele, que ele era um cara especial. E assim, por durante um ano, mesmo sem ver o rosto, nós sabíamos quem era o Fer. E torcemos tanto pra que ele viesse e esperamos ansiosamente por conhecê-lo, e quando ele chegou, ele nos conhecía. E nós o conhecíamos. Não foi preciso dizer nada, ele é o Fer. Nós, as meninas. Temos um amor em comum, a nossa Ketrina, essa pessoa que é ao mesmo tão fácil e tão difícil amar. E em meio a essa complexidade, os sentimentos acontecem naturalmente. E alguém como a Aline, só é possível mesmo amar.
Ele tem cachinhos loiros, ela cabelos negros. Ele, os olhos verdes e sereno. Ela, cor de amêndoas e ingênuo. Ele fala manso.. suave.. Ela fala. E fala. E repete, e conta tudo com detalhes. Ele ri baixinho e tem um humor peculiar e ela tem uma gargalhada exagerada e emite sons no final dela. Ele, da história, ela da Letras. E assim eles se completam.
E eu, que muitas vezes desacredito do amor. E eu, que muitas vezes desacredito das pessoas e do mundo. E eu que nem ao certo sei muito bem o que é o amor. Olho pra Fernando e Aline e tenho certeza, isso é amor. O sorriso que ela faz quando mostra a foto dele criança que carrega na pasta, aquele ano de incansáveis emails e cartas que buscavam preencher o vazio, as brigas e choros que acabam em abraços e beijos. A compreensão. A cumplicidade. As diferenças e as afinidades. Tudo isso se encaixa, se entende, se confunde.. Não existe Aline sem Fernando. Não existe Fernando sem Aline. Posso não poder por em palavras o que é o amor, mas eu sei: Fernando e Aline é amor.

"Te amo, sempre te amei (mesmo antes de te conhecer) e continuarei te amando depois q tudo acabar!!!Obrigada meu eu, meu amor, minha vida, o pai dos NOSSOS filhos "
...
"Preciso trabalhar para casar logo com a Aline. Não aguento mais não poder desejar a ela seu último boa noite e seu primeiro bom dia, eu a AMO.
Obrigado por vc ser tudo o que é e por não estar satisfeita com isso e sempre crescer mais, obrigado por ser eu e por eu ser vc, te AMO. "

O dia chegou, Fer. E nós sabemos o quanto vc trabalhou para que ele chegasse. O dia chegou, Aline. Sim, ele será o pai dos seus filhos, dos nossos sobrinhos que eu vou pararicar tanto e dos irmão de Fer, do neto da dna Clara, do Sr. Orlando, da Dna. Carminha, e eles vão brincar com a Nina e com a Meg e terão cheirinho de sabonete Natura.
E todos nós, que estamos aqui hoje, que esperamos por esse dia, sabemos que somente vocês realmente sabem o que isso tudo representa.
Pensando em uma canção, apenas uma me vem a mente (não poderia ser outra): "Eu trocaria a eternidade por essa noite...." Pois bem, essa noite vai ficar eternidade. Ela vai ficar gravada em todos que passaram por aqui, cantaram, choraram, sorriram, abraçaram, beijaram.. ela vai ficar em cada dia dessa vida de vcs que agora é uma só. E nos filhos. E nos netos. Nas fotos, nos videos.
E nos amigos.
Um dia, eu vou dizer para meus filhos, que o amor existe, que ele pode ser lindo e verdadeiro, porque eu conheci Fernando e Aline, porque eu vi eles se casarem e formarem uma linda família. E que viveram felizes para sempre!
Obrigada!

segunda-feira, julho 14, 2008

Se te queres matar

Fernando PessoaSe te queres matar, porque não te queres matar?
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, também me mataria...
Ah, se ousares, ousa!
De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas
A que chamamos o mundo?
A cinematografia das horas representadas
Por actores de convenções e poses determinadas,
O circo polícromo do nosso dinamismo sem fim?
De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
Talvez, matando-te, o conheças finalmente...
Talvez, acabando, comeces...
E de qualquer forma, se te cansa seres,
Ah, cansa-te nobremente,
E não cantes, como eu, a vida por bebedeira,
Não saúdes como eu a morte em literatura!

Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente!
Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém...
Sem ti correrá tudo sem ti.
Talvez seja pior para outros existires que matares-te...
Talvez peses mais durando, que deixando de durar...

A mágoa dos outros?... Tens remorso adiantado
De que te chorem?
Descansa: pouco te chorarão...
O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
Quando não são de coisas nossas,
Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
Porque é a coisa depois da qual nada acontece aos outros...

Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda
Do mistério e da falta da tua vida falada...
Depois o horror do caixão visível e material,
E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.
Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,
Lamentando a pena de teres morrido,
E tu mera causa ocasional daquela carpidação,
Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...
Muito mais morto aqui que calculas,
Mesmo que estejas muito mais vivo além...

Depois a trágica retirada para o jazigo ou a cova,
E depois o princípio da morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia...

Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste;
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.

Encara-te a frio, e encara a frio o que somos...
Se queres matar-te, mata-te...
Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência!...
Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida?

Que escrúpulos químicos tem o impulso que gera
As seivas, e a circulação do sangue, e o amor?
Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida?
Ah, pobre vaidade de carne e osso chamada homem.
Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?

És importante para ti, porque é a ti que te sentes.
És tudo para ti, porque para ti és o universo,
E o próprio universo e os outros
Satélites da tua subjectividade objectiva.
És importante para ti porque só tu és importante para ti.
E se és assim, ó mito, não serão os outros assim?

Tens, como Hamlet, o pavor do desconhecido?
Mas o que é conhecido? O que é que tu conheces,
Para que chames desconhecido a qualquer coisa em especial?

Tens, como Falstaff, o amor gorduroso da vida?
Se assim a amas materialmente, ama-a ainda mais materialmente:
Torna-te parte carnal da terra e das coisas!
Dispersa-te, sistema físico-químico
De células nocturnamente conscientes
Pela nocturna consciência da inconsciência dos corpos,
Pelo grande cobertor não-cobrindo-nada das aparências,
Pela relva e a erva da proliferação dos seres,
Pela névoa atómica das coisas,
Pelas paredes turbilhonantes
Do vácuo dinâmico do mundo...

sábado, julho 12, 2008

Outro dia, recebi um email da Isis com um video do Paulo Leminsk! Já fiquei pasmada.. mas qual não foi a minha surpresa quando eu vi os videos relacionados: uma entrevista com a Clarice Lispector. Nunca tinha ouvido a voz dela. Não conseguia imaginar o seu sotaque nordestino, mas teve algo que foi igualzinho como eu imaginava: o olhar. A postura austera.. profunda.. ao mesmo tempo misteriosa e transparente. E logo no início da entrevista, ela mostra cara de muito poucos amigos e diz ao entrevistador que quando ela não escreve ela está morta. É isso, Clarice dói. Tudo que ela escreve e diz é tão humano que dói. Ela conta sobre um conto que começou a escrever e não acabava mais e aí ela acabou rasgando. O entrevistador meio intelectual pergunta: é um ato de reflexão? De raiva. - ela responde categoricamente. Raiva de mim mesma.
Será que só eu que fico extasiada com a literatura??
Enfim,, voltando.. quando eu não escrevo, eu estou morta. Essa frase ficou na minha cabeça. Faz muito tempo que não venho ao blog.. sem cabeça pra pensar, pra refletir, pra expressar.. pra escrever! E isso não é estar um pouco morta?
Escrever, pra mim, é uma forma de extravasar.. não importa o que eu escreva: uma crônica, uma carta, ou um relato como esse..enfim, e pelo escrever que solto meus sentimentos, emoções, sensações, expressões.. se não escrevo, se não consigo escrever, sim, eu estou um pouco morta sim.
E esse blog ficou parado tanto tempo!! Vinha aqui.. olhava.. pensava em escrever, mas não saia. Lembrava das outras mil coisas pra fazer e não escrevia mais. Desistia. Não estava com vontade de pensar, de dizer o que quer que fosse.. talvez porque eu não entendesse, e eu não gosto de falar sobre o que eu não entendo. Aliás.. tudo parece tão longe da minha compreensão...
Bom, voltei. Estou aqui.
Pra me sentir um pouco mais viva.
E pra encerrar, mais um pouco dela:

"Não se preocupe em entender. Viver ultrapassa qualquer entendimento."